segunda-feira, junho 17, 2019

O “Canto escuro” de Daniel Barros



Imagine o seguinte cenário: você é um servidor público honesto, decente - como a maioria dos servidores públicos, mas você percebe que está no meio de um esquema de corrupção que envolve altos escalões do governo. Ao desconfiar que você pode estar sendo maquiavelicamente envolvido nessa história, você passa a desconfiar de tudo e de todos e procura, para sua própria segurança, a ajuda de amigos da polícia, para desbaratar essa quadrilha poderosa, correndo risco de vida. Este é o enredo de “Canto escuro”, último romance do alagoano Daniel Barros (Penalux, 2019).

Embora, aparentemente, o tema remeta de forma previsível à perspectiva de um romance policial, a narrativa desenvolvida com engenho pelo autor não se enquadra totalmente no gênero, pois, apesar da investigação do esquema de corrupção, o que se observa na história, desenvolvida em quatro partes, é a construção de um protagonista, Paulo Henrique, o funcionário público, a partir de suas aventuras e desventuras amorosas – que são muitas –de  seu problema com a bebida e com as mulheres, do seu drama baseado num eterno conflito conjugal e, é claro, do seu papel na investigação do esquema.

Daniel optou por antecipar a história na primeira parte, oferecendo ao leitor um gostinho prévio do que encontrará no decorrer da narrativa. Essa estrutura se mostra inteligente, pois o estranhamento inicial nos provoca a curiosidade. A partir da segunda e terceira partes, o autor desenvolve a história com habilidade suficiente para prender o leitor. A dinâmica do texto se dá a partir dos capítulos curtos que se sucedem numa velocidade que aumenta a cada página.

As cenas de amor são ingrediente importantíssimo desse prato degustado com avidez pelo leitor. Elas são importantes, pois é justamente a partir dessas cenas que entendemos a faceta “mulherengo” do protagonista. Sem cair na armadilha do vulgar, do chulo, as aventuras sexuais de Paulo Henrique nos são apresentadas pelo narrador e pelo próprio protagonista, em primeira pessoa, com a descrição elegante do encontro de um homem e uma mulher. A sucessão de mulheres, prostitutas ou não, torna Paulo Henrique uma espécie de Don Juan ébrio, pois o álcool parece fazer páreo duro nas predileções do personagem.

Envolvido diretamente no processo de contratação para o serviço público, e sabemos que toda área de contratação é alvo de lobistas e esquemas fraudulentos, Paulo Henrique, que ocupa um cargo importante na repartição, percebe movimentos estranhos na tramitação de processos que envolvem políticos. A desconfiança com relação à sua chefia imediata faz com que tente se proteger agindo como informante da polícia. A história acompanha o drama do servidor público que, além de lidar com a eventual perda do cargo que ocupa, por conta de sua recusa em integrar o esquema, tem que se preocupar com os problemas de sua vida pessoal que se encontra em crise (álcool, amores perdidos, ciúmes, a paternidade, etc.)

O romance agradará a qualquer leitor que se interesse por uma narrativa ágil, objetiva, inteligente e, acima de tudo, que toca num tema de atualidade inquietante: a corrupção em todas as instâncias do país. Daniel Barros mostra-se hábil construtor de uma história que nos fisga e que nos faz vibrar com um final empolgante, como uma espécie de gol da vitória aos 45 minutos do segundo tempo. Fica a dica: “Canto escuro” (Penalux, 2019), de Daniel Barros.

2 Comentários:

Blogger Daniel Barros disse...

Muito contente com a resenha. Obrigado

12:16 AM  
Blogger Valda Fogaça disse...

Daniel Barros, de acordo com a resenha "Canto Escuro é o livro que, sem sombra de dúvida, prenderá o leitor de tal modo que dificilmente o largaria antes de ler o termo Epílogo. Eu particularmente não vejo a hora de lê-lo.

3:39 AM  

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial